Recebi ontem por email este excelente artigo do Cronista Ferreira Gullar publicado em 30 de setembro de 2012 no jornal "A Folha de São Paulo" que cabe neste momento de decisões importantes do STF.
Gostaria de deixar claro que não tenho nada de pessoal contra o
ex-presidente Lula, nem nenhum compromisso partidário, eleitoral ou
ideológico com ninguém. Digo isso porque, nesta coluna, tenho emitido,
com alguma frequência, opiniões críticas sobre a atuação do referido
político, o que poderia levar o leitor àquela suposição.
Não resta dúvida de que tenho sérias restrições ao seu comportamento e
especificamente a certas declarações que emite, sem qualquer compromisso
com a verdade dos fatos. E, se o faço, é porque o tenho como um líder
político importante, capaz de influir no destino do país. Noutras
palavras, o que ele diz e faz, pela influência de que desfruta, importa a
todos nós.
E a propósito disso é que me surpreende a facilidade com que faz
afirmações que só atendem a sua conveniência, mas sem qualquer
compromisso com a verdade. É certo que o faz sabendo que não enganará as
pessoas bem informadas, mas sim aquelas que creem cegamente no que ele
diga, seja o que for.
Exemplo disso foi a entrevista que deu a um repórter do "New York
Times", quando voltou a afirmar que o mensalão é apenas uma invenção de
seus adversários políticos. E vejam bem, ele fez tal afirmação quando o
Supremo Tribunal Federal já julgava os acusados nesse processo e já
havia condenado vários deles. Afirmar o que afirmou em tais
circunstâncias mostra o seu total descompromisso com a verdade e total
desrespeito com às instituições do Estado brasileiro.
Pode alguém admitir que a mais alta corte de Justiça do país aceitaria,
como procedentes, acusações que fossem meras invenções de políticos e
jornalistas irresponsáveis?
E mais: os ministros do STF passaram sete anos analisando os autos desse
processo, tempo mais que suficiente para avaliá-lo. Afirmar, como faz
Lula, que tudo aquilo é mera invenção equivale a dizer, implicitamente,
que os ministros do STF são coniventes com uma grande farsa.
Mas o descompromisso de Lula com os fatos parece não ter limites. Para
levar o entrevistador do "NYT" a crer na sua versão, disse que não
precisava comprar votos, pois, ao assumir a Presidência, contava com a
maioria dos deputados federais.
Não contava. Os verdadeiros dados são os seguintes: o PT elegera 91
deputados; o PSB, 24,; o PL, 26, o PC do B, 12, num total de 153
deputados. Mesmo com os eleitos por partidos menores, cuja adesão
negociava, não alcançava a metade mais um dos membros da Câmara Federal.
Cabe observar que ele não disse ao jornalista norte-americano que não
comprou os deputados porque seria indigno fazê-lo. Disse que não os
comprou porque tinha maioria, ou seja, não necessitava comprá-los.
Pode-se deduzir, então, que, como na verdade necessitava, os comprou.
Não há que se surpreender, Lula é isso mesmo. Sempre o foi, desde sua
militância no sindicato. Para ele, não há valores: vale o que o levar ao
poder ou o mantiver nele.
Sucede que, apesar do que diga, ninguém mais duvida de que houve o
mensalão. Pior ainda, corre por aí que o Marcos Valério está disposto a
pôr a boca no mundo e contar que o verdadeiro chefe da patranha era o
Lula mesmo, como, aliás, sempre esteve evidente. E já o procurador-geral
da República declarou que, se os dados se confirmarem, o processará. É
nessas horas que o Lula falastrão se cala e desaparece. Às vezes, chama
Dilma para defendê-lo.
Desta vez, chamou o Rui Falcão, presidente do PT, para articular o apoio
dos líderes da base política do governo. Disso resultou um documento
desastroso, que chega ao ponto de acusar o Supremo de perpetrar um golpe
de Estado contra a democracia, equivalente aos golpes que derrubaram
Vargas e João Goulart. Pode? Vargas e Goulart, como se sabe, foram
depostos pela extrema direita com o apoio de militares golpistas.
O julgamento do STF realiza-se às claras, à vista de milhões de
telespectadores. Não é uma conspiração. Ele desempenha as funções que a
Constituição lhe atribui. E que golpe é esse contra um político que não
está no poder?
O tal manifesto só causou constrangimento. O governador Eduardo Campos,
de Pernambuco, deu a entender que foi forçado a assiná-lo, após rejeitar
três versões dele. Enfim, mais um vexame. Só que Lula, nessas horas,
não aparece. Manda alguém fazer por ele, seja um manifesto, seja um
mensalão.